domingo, 12 de março de 2017

As profissões do sonho (Profissonhos, de Leo Cunha)




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                     O que você quer ser quando crescer? Eis aí uma pergunta que todo mundo já ouviu alguma vez na vida, sobretudo quando ainda se é criança. E é exatamente essa pergunta o ponto de partida de Leo Cunha nesse criativo livros de poesias infantis, verdadeiro guia poético para a "escolha" da profissão futura pelos leitores-mirins...
            Com efeito, em Profissonhos, Leo Cunha (2012) parece querer levar ao limite da expressão literária a brincadeira com o imaginário infantil ligado às profissões do sonho de cada criança, empregando, para tanto, não apenas o jogo com as palavras - já que confere a elas um sentido para além de seu valor referencial -, mas também o jogo com as ideias, o que funciona como uma forma de despadronização de um modo de pensar pautado no senso comum e nas ideias pré-concebidas. A ilustração objetiva, quase minimalista, de Gilles Eduar - com seus animais exercendo as mais diferentes profissões! - complementa essa leitura positiva da obra...
            Dando densidade às imagens, o autor constrói um universo em que a surpresa torna-se o Leitmotiv de seus poemas, atingindo rara unidade poética. Isso é facilmente verificado em alguns de suas peças dotadas de rara sensibilidade lírica, o que torna sua literatura um conjunto inesperado de imagens delicadas, como nesse singelo "Bailarina":

"A façanha
de uma ave
que ensaia mil vezes
o voo.

O fascínio
de uma ave
que repete mil voos
diferentes." (p. 13)

            O jogo com palavras parecidas (façanha/fascínio) e com ideias que se contradizem (ensaiar mil vezes o voo para repeti-lo mil vezes diferente!) fazem de sua poesia um despertar contínuo para a surpresa estética. Aliás, a utilização, num mesmo poema, de palavras que possuem uma correlação fônica (façanha/fascínio, bula/bulir, tropeça/trapaça/trapézio) é recurso comum em sua produção poética, tornando-se um dos artifícios literários mais empregados pelo autor. Outro artifício comum é, ainda no âmbito dos vocábulos, a utilização de palavras que fazem parte de um mesmo étimo (olho, olha, olhando), criando assim outros tantos efeitos criativos, muitas vezes aliados a neologismos, como em "Inventor":

"Suas crias
sopram a poeira
do conhecido.
Inventos? Não,
inventanias.

Suas misturas
batem as asas
da imaginação.
Inventos? Não,
inventuras." (p. 21)

            Há ainda outros artifícios desse verdadeiro artesão das palavras e das imagens, agora no âmbito semântico, resultando numa espécie manipulação dos sentidos e significados de palavras e expressões, por meio de inversões e contrastes, como em "Fotógrafo":

"Alguns
têm o olho parado
no tempo.

Alguns
têm o tempo parado
no olho." (p. 20)


            Fazendo parte de uma ilustre tradição literária, que tem em suas fileiras nomes como os de Cecília Meireles e Sidônio Muralha (alguns de seus poemas são francamente inspirados em peças desses dois autores), Leo Cunha traz para o leitor a experiência de um cotidiano carregado de sensibilidade... e o que começa sendo profissão termina sendo sonho: profissonho.
            Afinal, como ele diz em seu primeiro poema, diante da pergunta  - O que você vai ser quando crescer:

"Vai ser o que sonhar..." (p. 10).

Referências
CUNHA, Leo. Profissonhos. Um guia poético. Rio de Janeiro, Planeta, 2012.

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