O
que você quer ser quando crescer? Eis aí uma pergunta que todo mundo já
ouviu alguma vez na vida, sobretudo quando ainda se é criança. E é exatamente
essa pergunta o ponto de partida de Leo Cunha nesse criativo livros de poesias
infantis, verdadeiro guia poético
para a "escolha" da profissão futura pelos leitores-mirins...
Com efeito, em Profissonhos, Leo Cunha (2012)
parece querer levar ao limite da expressão literária a brincadeira com o
imaginário infantil ligado às profissões do sonho de cada criança, empregando,
para tanto, não apenas o jogo com as
palavras - já que confere a elas um sentido para além de seu valor
referencial -, mas também o jogo com as
ideias, o que funciona como uma forma de despadronização de um modo de
pensar pautado no senso comum e nas ideias pré-concebidas. A ilustração objetiva, quase minimalista, de Gilles Eduar - com seus
animais exercendo as mais diferentes profissões! - complementa essa leitura
positiva da obra...
Dando densidade às imagens, o autor
constrói um universo em que a surpresa torna-se o Leitmotiv de seus poemas, atingindo rara unidade poética. Isso é
facilmente verificado em alguns de suas peças dotadas de rara sensibilidade
lírica, o que torna sua literatura um conjunto inesperado de imagens delicadas,
como nesse singelo "Bailarina":
"A façanha
de uma ave
que ensaia mil vezes
o voo.
O fascínio
de uma ave
que repete mil voos
diferentes." (p.
13)
O jogo com palavras parecidas
(façanha/fascínio) e com ideias que se contradizem (ensaiar mil vezes o voo
para repeti-lo mil vezes diferente!) fazem de sua poesia um despertar contínuo
para a surpresa estética. Aliás, a utilização, num mesmo poema, de palavras que
possuem uma correlação fônica (façanha/fascínio, bula/bulir,
tropeça/trapaça/trapézio) é recurso comum em sua produção poética, tornando-se
um dos artifícios literários mais empregados pelo autor. Outro artifício comum
é, ainda no âmbito dos vocábulos, a utilização de palavras que fazem parte de
um mesmo étimo (olho, olha, olhando), criando assim outros tantos efeitos criativos,
muitas vezes aliados a neologismos, como em "Inventor":
"Suas crias
sopram a poeira
do conhecido.
Inventos? Não,
inventanias.
Suas misturas
batem as asas
da imaginação.
Inventos? Não,
inventuras." (p.
21)
Há ainda outros artifícios desse
verdadeiro artesão das palavras e das
imagens, agora no âmbito semântico, resultando numa espécie manipulação dos
sentidos e significados de palavras e expressões, por meio de inversões e
contrastes, como em "Fotógrafo":
"Alguns
têm o olho parado
no tempo.
Alguns
têm o tempo parado
no olho." (p.
20)
Fazendo parte de uma ilustre
tradição literária, que tem em suas fileiras nomes como os de Cecília Meireles
e Sidônio Muralha (alguns de seus poemas são francamente inspirados em peças
desses dois autores), Leo Cunha traz para o leitor a experiência de um
cotidiano carregado de sensibilidade... e o que começa sendo profissão termina sendo
sonho: profissonho.
Afinal, como ele diz em seu primeiro
poema, diante da pergunta - O que você vai ser quando crescer:
"Vai
ser o que sonhar..." (p. 10).
Referências
CUNHA, Leo. Profissonhos. Um guia poético. Rio de
Janeiro, Planeta, 2012.
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